Uso abusivo de analgésicos pode levar a "vício" psíquico
Para conseguir suportar as dores de cabeça que a atormentam dia sim, dia não, desde os 15 anos, a advogada Vanessa Balan, 33, recorre logo aos analgésicos.
Sempre que o remédio deixa de fazer efeito, troca de marca ou princípio ativo. Nas crises mais fortes, consome até três comprimidos por dia.
Ela e muita gente. Em 2009, os brasileiros destinaram mais de R$ 1,5 bilhão para a compra de dipirona, aspirina e ibuprofeno, alguns dos analgésicos mais vendidos. Equivale a mais de 120 milhões de embalagens, segundo o IMS Health, que audita o mercado farmacêutico.
O uso abusivo e a automedicação levaram a Anvisa a suspender a exposição dessas drogas nas gôndolas.
No caso da dor de cabeça, o problema é mais grave, porque essas drogas têm efeito rebote: quanto mais a pessoa toma, mais dor tem. Uma análise de estudos publicada no "British Medical Journal" mostra que a ingestão em 15 dias do mês é suficiente para causar o efeito.
Cerca de 7% da população tem cefaleia crônica. É o grupo que sofre de dor mais de 15 dias ao mês -e está sujeito ao abuso de analgésicos.
O efeito rebote parece ser desencadeado pelo uso regular dessas drogas: tomar um comprimido todos os dias é mais arriscado do que ingerir três uma só vez por semana.
"A cefaleia de rebote também é comportamental. A ansiedade e o medo de ter dor trazem mais dor, não é só o uso do analgésico", diz o neurologista Mario Peres, do hospital Albert Einstein.
O uso abusivo provoca efeitos colaterais, como hipertensão, gastrite e hepatite -além de dependência psíquica. Que o diga Vanessa: "Se não tiver o remédio na bolsa, já fico neurótica, achando que vou ter dor."
"Tem gente que acha que vai ter dor e já toma aspirina. Isso, quatro vezes por semana. Alguns nem sabem que os analgésicos podem causar problemas sérios", diz Irimar de Paula Posso, chefe da equipe de controle de dor da divisão de anestesia do Hospital das Clínicas.
A aspirina, por exemplo, inibe a produção das prostaglandinas, que protegem a mucosa gástrica e os rins. "Isso causa hipertensão e insuficiência cardíaca. Basta tomar todo dia", diz Posso.
O paracetamol, por sua vez, pode produzir hepatite medicamentosa -principal causa de transplantes de fígado nos Estados Unidos.
APAGANDO INCÊNDIO
Em vez de apelar para paliativos, o certo é prevenir as crises. "É preciso saber os fatores desencadeantes. O analgésico só está apagando incêndio", afirma Peres.
Se o abuso de analgésicos já é um fato, indica-se um tratamento de transição, com drogas que não causam efeito rebote ou que são utilizadas por pouco tempo, antes de atacar a origem da dor.
A interrupção do ciclo vicioso pode, sim, trazer sensações desagradáveis. Muitos analgésicos contêm altas doses de cafeína, e sua falta causa a chamada cefaleia de retirada. Por isso, é bom um acompanhamento médico para parar com essas drogas.
(Raquel Botelho – Folha de São Paulo em 27/05/2010)
(Clic na imagem para vê-la em tamanho grande.)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Adorei receber sua visita!
Ler seu comentário, é ainda melhor!!!
Responderei sempre por aqui.