Empreendedores criam polo eletromédico
O dia 16 de janeiro de 2006 marcou para sempre a vida do
jovem administrador Paulo Vlady, hoje com 31 anos. Ele voltava para casa, em
Santa Rita do Sapucaí, no sul de Minas, quando um automóvel entrou na contramão
e colidiu com sua moto. Sua perna esquerda ficou estraçalhada, como ele mesmo
diz. Na verdade, houve fraturas expostas, esmigalhamento de osso e perda óssea.
Os médicos chegaram a dizer que a perna teria de ser amputada. Vlady não
aceitou essa possibilidade e continuou se submetendo aos tratamentos possíveis
e que estavam ao seu alcance.
No total, foram cinco cirurgias e sete meses gastos em
hospitais. A princípio, ele só queria saber de se recuperar para poder voltar a
trabalhar. Mas as observações das rotinas hospitalares que fazia durante os
tratamentos o levaram a pensar na criação de equipamentos para o setor.
“Percebi uma necessidade muito grande de tecnologia na área
médica, porque ou eram equipamentos muito complexos, que exigiam soluções muito
elaboradas, ou, na outra ponta, havia um pessoal fazendo as coisas de forma
artesanal. Eram aparelhos de 1940 que não tinham evoluído”, conta. “A ideia era
fazer equipamentos que conseguíssemos propor tecnologias modernas a baixo
custo.”
Em 2007, a vontade empreendedora de Vlady resultou na
criação, em conjunto com mais dois sócios – um engenheiro e um médico –, da
Biotron, que nasceu na incubadora Prointec. No entanto, como os produtos
eletromédicos requerem um longo período para chegar ao mercado, a empresa
passou, estrategicamente, a produzir inicialmente para o segmento odontológico,
até que as demais ferramentas pudessem ser lançadas.
“O segmento odontológico é mais aberto e tão necessitado
quanto o médico de tecnologia. Aproveitando toda estrutura e todo know-how que
tínhamos, começamos a desenvolver produtos para essa área, como o negatoscópio
(um visualizador de radiografias). Tivemos uma aceitação muito boa, e os
próprios clientes começaram a sugerir novos produtos.” Os primeiros chegaram ao
mercado em 2008, quando os dois primeiros sócios já tinham deixado a empresa.
Uma administradora passou a fazer parte da Biotron.
“Até o ano passado, produzíamos exclusivamente para
dentistas. Agora, em 2013, já temos outras parcerias, e os equipamentos que
desenvolvemos para o segmento médico serão lançados. Conseguimos os registros e
vamos começar a colocá-los no mercado”, diz Vlady, que se recuperou do
acidente.
Um desses equipamentos mede o estímulo que o cérebro emite
para o músculo comprometido e a capacidade com que este sinal está sendo
recebido. Ele consegue identificar qual é o nível de debilidade do músculo e, à
medida que se faz o tratamento, consegue apurar a evolução da recuperação e
fazer uma previsão de em quanto tempo, mantendo o tratamento naquele ritmo, o
paciente terá sua capacidade motora restabelecida. É indicado para vítimas de acidentes,
pessoas que sofreram um AVC e até para atletas que lutam contra lesões.
Para o empresário, foi decisivo estar no chamado vale dos
eletrônicos, a região de Minas onde estão Itajubá e Santa Rita do Sapucaí. A
região forma um dos maiores centros tecnológicos do País, congregando
conhecimento nas áreas de eletrônica, informática e comunicações, graças a
pesquisas consideradas inovadoras e ao processo de incubação de empresas. De
acordo com o Sebrae, esse quadro propicia um clima que estimula a criação e o
desenvolvimento de micro e pequenos empreendimentos.
Há um caldo de cultura que ajudou não apenas Paulo Vlady a
dar o pontapé inicial na Biotron, mas também várias outras pessoas a criar
empresas na região, também chamada de Vale do Silício brasileiro. “O fato de
estarmos aqui já é uma grande vantagem competitiva. Aqui temos várias empresas
que prestam serviços na fase de produção”, diz Vlady. “Há uma empresa que faz a
gestão de componentes na placa, outra faz a injeção plástica, outra que faz
toda a parte mecânica. A minha responsabilidade como indústria é desenvolver o
projeto, montar os protótipos, fazer a unificação das partes, teste e
certificação.” Ele até monta alguns produtos, mas aqueles que têm menor volume
de escala de produção. “Mas faço a integração de todos.”
Na mesma época da Biotron, que tem uma linha de 25 produtos
– como negatoscópio slim e com LED, acionadores elétricos, máquinas de
biossegurança, câmara intraorais – e pretende lançar um a cada dois meses neste
ano, começaram a surgir outras empresas interessadas no mercado de
eletromédicos.
Uma delas é a AutHosp. O sócio, Diovani Gomes Ribeiro, de 30 anos, conta que
durante o curso de automação industrial, em Itajubá, queria aproveitar a
tecnologia para criar algo de valor para a sociedade. Desse desejo, veio a
ideia de criar produtos eletromédicos. Passou, então, a pesquisar sobre o tema,
e encontrou um professor, que tinha, segundo Ribeiro, uma ideia para um produto
“revolucionário”.
“Trata-se da cadeira que produzimos hoje. Ela é voltada para o tratamento de
feridas e queimaduras”, conta. “O professor era um profissional da área, sabia
que havia uma demanda muito grande para isso. Ele sabia o que queria, mas não
sabia como fazer. Eu sabia como fazer e não sabia qual era demanda. Somamos as
duas forças e a companhia nasceu na Incubadora de Empresas de Base Tecnológica
de Itajubá (Incit).
O acadêmico acabou deixando a sociedade, mas o projeto de
desenvolver a cadeira continuou e já está hoje à venda. Com ela, são 38
produtos fabricados pela AutHosp, como maca elétrica, biombos e armários, entre
outros. Em 2012, a AutHosp faturou R$ 1,2 milhão, tem entre seus clientes
hospitais públicos e privados, clínicas e unidades de saúde das Forças Armadas.
E deve começar, neste ano, a exportar para a América Latina.
A Lifetec, criada em 2008, teve o apoio da incubadora do
Inatel. Tem três sócios: a administradora Andreia Malaquias dos Santos, o
médico e dentista Fernando Henrique de Faria, e o engenheiro Marcelo Henrique
Vieira, do Inatel. Hoje, a empresa é associada à incubadora Prointec e conta
com o apoio do Sebrae. “Com este apoio, conseguimos ter capacitação e nos
tornamos uma empresa com destaque em inovação”, conta Andreia, lembrando que a
Fifetec foi a primeira a fabricar negatoscópio em LED no Brasil e prevê lançar cinco
novos produtos neste ano.
Conhecimento e mão de obra qualificada
Não é à toa que as empresas voltadas para o mercado de
eletromédicos surgem naquela região do sul de Minas Gerais. “Todo dia nasce
empresa aqui no vale dos eletrônicos”, diz Andreia Malaquias dos Santos, da
Lifetec.
O “vale dos eletrônicos” é uma região de estímulo ao empreendedorismo, ao unir
conhecimento e apoio a empresas nascentes. “Aqui em Santa Rita do Sapucaí,
encontramos engenheiros formados pelo Inatel na área de biomédica, temos mão de
obra na área de administração, formada pela Faculdade de Administração e
Economia (FAE), há a escola técnica de eletrônica, onde se encontra mão de obra
especializada”, acrescenta a empresária Andreia.
Paulo Vlady, da Biotron, afirma que, se não fosse a região, seu projeto nunca
teria se concretizado. “Aqui, existem muitas empresas, todas com esse viés
tecnológico, o que propicia um relacionamento mais fácil, não só pela
proximidade logística, mas pela interação, pela troca de informações,
conhecimento tecnológico. Aqui todo mundo fala a mesma língua. Não há aquela dificuldade
de explicar para o fornecedor que um certo componente precisa de aterramento,
que tem de ter aquele cuidado com embalagem. É muito complexo. Aqui é tudo
automático, você fala que quer a placa pronta, e o fornecedor já entrega tudo
mastigado”, alega Vlady.
Esse clima leva empreendedores e empresas a desenvolver produtos inovadores que
possam ter um bom valor agregado. Diovani Gomes Ribeiro, da AutHosp, afirma que
sua companhia foi a primeira no mundo a desenvolver a cadeira tecnológica para
auxiliar no tratamento de feridos e queimados principalmente na parte inferior
do corpo, embora existissem outras semelhantes, mas não automatizadas e para
essa finalidade.
Com ela, o paciente, muitas vezes obeso, é colocado numa posição confortável,
simplesmente acionando um botão, e que também proporciona ergonomia ao
profissional de saúde para que ele venha manusear o paciente.
Ribeiro lembra que o procedimento agiliza o atendimento hospitalar, e o
profissional pode fazer até cinco vezes mais atendimentos com menos desgaste.
Ela garante que o produto tem um preço atraente.
“Como tem tecnologia, tem um valor agregado um pouco maior. Mas tentamos fazer
um equilíbrio entre um bom preço e a qualidade para não ficar muito oneroso”,
comenta Ribeiro, sem revelar o valor.
A busca por produtos inovadores, com tecnologia e bom valor agregado é a marca
das empresas da região, segundo dizem seus sócios.
Sebrae auxilia empresas do setor
O Sebrae de Minas Gerais criou o Projeto de Desenvolvimento
do Setor Eletromédico do Sul de Minas com o objetivo de consolidar a
competitividade e estimular a inovação do polo no mercado. A entidade auxilia
os empreendedores em processos de gerenciamento e de gestão , na obtenção de
certificações e na captação de recursos. De acordo com Rodrigo Pereira, técnico
do Sebrae em Santa Rita do Sapucaí, um passo inicial do projeto foi a criação
do Grupo das Empresas de Produtos e Serviços para a Saúde (GEPSS).
O apoio da entidade contribui no desenvolvimento do produto,
na sua adequação ao mercado e às exigências de certificação feitas pela Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O selo da agência e mais o do
Inmetro são pré condição para que os produtos cheguem ao mercado.
O Sebrae também promove a capacitação para que as empresas
possam lançar mão de boas práticas de fabricação e dá apoio no processo de
acesso ao mercado, como na participação em feiras e exposições.
De acordo com o técnico, as empresas procuram criar
equipamentos com o diferencial baseado na inovação e com valor agregado vindo
principalmente com a substituição de importações, já que este é um dos
objetivos do projeto. Pereira lembra que a construção de um hospital
modelo, que entrará em atividade no meio deste ano, vai aumentar a demanda por
produtos do segmento.
(Fonte: Cláudio Marques – Estadão em 05/02/2013)
Nidia , boa noite
ResponderExcluirPasso para agradecer sua visita ao meu blog e reclamar que não tem postado mais ...
Seu bom gosto faz falta .
Beijos
Oi, Marisa.
ExcluirAcabei de me mudar de cidade e estou muito ocupada colocando coisas no lugar. Não tenho tido tempo, mas logo voltarei a dar atenção ao blog.
Sempre dou uma passadinha no seu.
Beijos