"Roubado" do Blog do Noblat.
Cicatrizes
Abaixo do
polegar, um pouco acima do punho, levo uma cicatriz. As circunstâncias que a
produziram fizeram com que essa cicatriz formasse um risco negro, fino, quase
uma tatuagem a marcar a pele da mão. Claramente visível. Com um procedimento
simples, seria possível removê-la. Sempre me recusei. Já se vão décadas que ela
me acompanha. Ela faz parte do que sou.
Toda
cicatriz conta uma história. Por trás de cada uma delas tem o caminho, a série
de eventos que resultaram naquela marca no corpo, na alma ou na consciência.
Parte da vida é colecionar cicatrizes. É aceitar a inevitabilidade do
sofrimento. É transformar o sofrimento da ferida no aprendizado e na história
que a cicatriz marca.
As
cicatrizes no corpo, na alma ou na mente são o mapa da trajetória de cada um.
Elas são de todos os tipos. Algumas causam orgulhos, outras causam tristeza,
outras não se fecham jamais. Mas todas contam historias. Todas marcam eventos.
Todas imprimem o tempo.
O ser
humano parece estar sempre condenado a ter a própria alma ferida e a ferir a
alma do outro. Ser simultaneamente vítima e causa de sofrimento. Ser, ao mesmo
tempo, portador e causa de cicatrizes.
Cicatrizes
são marcas que não perdoam. Permanecem lá como testemunhas e memória permanente
da trajetória de cada um. Registram erros e acertos; atos de coragem e de
covardia; vitorias e derrotas; o certo e o errado. Transformam sofrimento em
experiência e aprendizado.
As marcas
que a vida deixa na pele, na alma e na mente são parte importante da
experiência humana. Talvez sejam elas, as marcas, que nos tornam, a cada um de
nós, alguém especial, único.
Por isto não
removo minhas cicatrizes. Sem elas, eu não sou.
(Elton Simões mora no Canadá. Formado em Direito (PUC);
Administração de Empresas (FGV); MBA (INSEAD), com Mestrado em Resolução de
Conflitos (University of Victoria). E-mail: esimoes@uvic.ca . Escreve aqui às
segundas-feiras.)
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