terça-feira, 13 de setembro de 2011

As várias Canções do Exílio - 7 - Carlos Drummond de Andrade

Novamente Carlos Drummond de Andrade “viaja” pela Canção do Exílio no texto e no contexto. Ele não descreve o Brasil, mas o mundo que faz o olhar brasileiro enxergá-lo como algo que deixou de ser fascinante. O poeta cria um modo irônico de ver a decadência da europeia. É a criatura devorando o criador. Não apenas Portugal, mas todo o continente antes dominador.
A Europa, o doce exílio da intelectualidade brasileira, é caricaturada e aparece sem a grandiosidade colonial. Drummond faz caricaturas da França, Inglaterra, Alemanha, Itália, Suíça, Rússia... Há quase que uma zombaria diante da destruição do poder da civilização. Não é necessário mais ser escravo das supercivilizações agora decadentes.
A ideia é a mesma da Canção do Exílio de Gonçalves Dias: a saudade da terra natal, independentemente da citação no final do poema. No poema Europa, França e Bahia do livro Alguma Poesia (1930), Drummond, através da palavra constrói o mundo ideal que lhe é mostrado por um novo olhar. Os mesmos olhos que lhe clareiam a memória são fechados para lhe fazer lembrar da “minha terra... / Ai terra que tem palmeira / onde canta o sabiá!”.

Europa, França e Bahia

Meus olhos brasileiros sonhando exotismos.
Paris. A torre Eiffel alastrada de antenas como um caranguejo.
Os cais bolorentos de livros judeus
e a água suja do Sena escorrendo sabedoria.

O pulo da Mancha num segundo.
Meus olhos espiam olhos ingleses vigilantes nas docas.

Tarifas bancos fábricas trustes craques.
Milhões de dorsos agachados em colônias longínquas formam um tapete
para sua Graciosa Majestade Britânica pisar.
E a lua de Londres como um remorso.

Submarinos inúteis retalham mares vencidos.
O navio alemão cauteloso exporta dolicocéfalos arruinados.
Hamburgo, umbigo do mundo.
Homens de cabeça rachada cismam em rachar a cabeça dos outros
dentro de alguns anos.

A Itália explora conscienciosamente vulcões apagados,
vulcões que nunca estiveram acesos
a não ser na cabeça de Mussolini.
E a Suíça cândida se oferece
numa coleção de postais de altitudes altíssimas.

Meus olhos brasileiros se enjoam da Europa.

Não há mais Turquia
O impossível dos serralhos esfacela erotismos prestes a deslanchar.
Mas a Rússia tem as cores da vida.
A Rússia é vermelha e branca.
Sujeitos com um brilho esquisito nos olhos criam o filme bolchevista
e no túmulo de Lenin em Moscou parece que um coração enorme
está batendo, batendo
mas não bate igual ao da gente...

Chega!
Meus olhos brasileiros se fecham saudosos.
Minha boca procura a "Canção do Exílio".
Como era mesmo a "Canção do Exílio"?
Eu tão esquecido de minha terra...
Ai terra que tem palmeiras
onde canta o sabiá!
(Carlos Drummond de Andrade)

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